Um homem foi bater à porta do rei e
disse-lhe, Dá-me um barco. A casa do rei tinha muitas mais portas,
mas aquela era a das petições. Como o rei passava todo o tempo
sentado à porta dos obséquios (entenda-se, os obséquios que lhe
faziam a ele), de cada vez que ouvia alguém a chamar à porta das
petições fingia-se desentendido, e só quando o ressoar contínuo da
aldraba de bronze se tornava, mais do que notório, escandaloso,
tirando o sossego à vizinhança (as pessoas começavam a murmurar,
Que rei temos nós, que não atende), é que dava ordem ao
primeiro-secretário para ir saber o que queria o impetrante, que
não havia maneira de se calar. Então, o primeiro-secretário chamava
o segundo-secretário, este chamava o terceiro, que mandava o
primeiro-ajudante, que por sua vez mandava o segundo, e assim por
aí fora até chegar à mulher da limpeza, a qual, não tendo ninguém
em quem mandar, entreabria a porta das petições e perguntava pela
frincha, Que é que tu queres. O suplicante dizia ao que vinha, isto
é, pedia o que tinha a pedir, depois instalava-se a um canto da
porta, à espera de que o requerimento fizesse, de um em um, o
caminho ao contrário, até chegar ao rei. Ocupado como sempre estava
com os obséquios, o rei demorava a resposta, e já não era pequeno
sinal de atenção ao bem-estar e felicidade do seu povo quando
resolvia pedir um parecer fundamentado por escrito ao
primeiro-secretário, o qual, escusado se ria dizer, passava a
encomenda ao segundo-secretário, este ao terceiro, sucessivamente,
até chegar outra vez à mulher da limpeza, que despachava sim ou não
conforme estivesse de maré.
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Para ler o texto completo acesse: http://www.releituras.com/jsaramago_conto.asp
Fontes:
ufrgs.br/tramse/pead/textos/saramago.pdf
http://www.releituras.com/jsaramago_conto.asp
José Saramago:Foi laureado com o
Prêmio Nobel da Literatura 1998 pela The Nobel Foundation. Para
saber sua biografia acesse: http://josesaramago.blogs.sapo.pt/95699.html
E se as histórias para crianças
passassem a ser de leitura obrigatória para os
adultos?
Seriam eles capazes de aprender realmente o que há tanto
tempo têm andado a ensinar?