"A vida só pode ser compreendida olhando-se para trás e
só pode ser vivida olhando-se para
frente."
S. A. Kierkegaard
Existe uma estória* que sempre é repetida por
aqueles que gostam de pensamentos baseados no budismo, onde dizem
que antes de um rio entrar no mar, ele treme de medo, assim como a
maioria de nós quando tem que tomar uma decisão que é
inevitável, ou quando tem que aceitar que a vida por fim acaba
passando e tudo é transitório.
O rio "olha" para trás, para toda a jornada que percorreu, para
os cumes, as montanhas, para o longo caminho sinuoso que trilhou
através de florestas e povoados, e vê à sua frente um oceano tão
vasto, que entrar nele nada mais é do que desaparecer para sempre.
Mas não há outra maneira. O rio não pode voltar. Ninguém pode
voltar. Voltar é impossível na existência.
E somente quando ele entra no oceano é que o medo desaparece,
porque apenas então o rio saberá que não se trata de desaparecer no
oceano, mas de tornar-se oceano.
Todavia, gradativamente a água do oceano vai se evaporando pela
atmosfera até se tornar uma nuvem e então o vento vai levando esta
nuvem carregada até que por fim começa a chover. A chuva derrama
toda a água sobre a mesma montanha onde nasceu o rio/oceano e agora
novamente realimenta seu nascedouro.
Nós, tentado imitar a natureza, criamos os nossos ciclos
imaginários e os padronizamos com algum tipo de numeração tendo por
base mitos que por nós também foram eleitos, dando um significância
e relevância para a nossa existência relativa e passageira. Talvez
uma tentativa desesperada de não reconhecer a impermanência.
Mas o que realmente nos ensina esta estória do rio?
Você provavelmente irá tirar muitas conclusões, mas para mim o
preponderante é que precisamos sempre estar nascendo de novo e
somente percebemos isso quando realmente nos esquecemos do passado
e passamos a ser uma "nova" pessoa.
Quando vejo pessoas desejando um ano novo sem as mágoas, ódios e
ressentimentos do passado logo vem à minha mente que realmente vão
continuar carregando estes fardos, pois se realmente tivessem
nascido de novo não teriam a memória do passado e simplesmente não
mais teriam este desejo, não?
Bem, você poderá argumentar que perder a memória é uma doença
terrível e, portanto, não se pode prescindir dela ou alterá-la pois
passado é sagrado, sacramentado, justamente porque é imutável.
Se perdermos a nossa memória iremos perder a nossa identidade e
então não seremos ninguém.
Retruco - ser ninguém**
tem muito mais a nos ensinar do que podemos imaginar à primeira
vista.
Logo, já que estamos por aqui, o melhor é aceitar a sugestão do
Kierkegaard e ver o "ano novo" como um "olhar para a frente" e
perguntar para os nossos corações para onde ele deseja nos levar,
em seguida perguntar para a Razão e questionar se vale a pena.
Na dúvida, o que sempre é muito salutar e natural, lembre-se o
que disse o Fernando Pessoa:
"Tudo vale a pena quando a Alma não é pequena
Navegar é preciso
Viver não é preciso"
"Onde há vontade (desejo) há um caminho" - >
"Where this a will - Where this a way"
Mãe do Leonard Mlodinow ->
Fonte: Leonard Mlodinow no Conversa com
Bial (TV Globo) - 27/9/2018->http://bit.ly/2BTZvSi
* Fonte: Osho
-> https://www.pensador.com/frase/NTE2MDM1/
** Fonte:
http://ibisliteraturaearte.com/revista/edicao_2/emily-dickinson/